16 de fev. de 2010

A Xica

 Almeida Junior - Saudades
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Antigamente escreviam-se cartas que seguiam pela mala postal do próximo vapor. Quando era muito urgente telegrafava-se.
Antigamente os sentimentos cumpriam o horários dos paquetes, dos comboios, dos correios.
Antigamente a hora de chegada do carteiro era o momento mais ansiado, mais odiado do dia.
Antigamente o abrir de um envelope era o instante do aperto do coração.
Antigamente escrevia-se em papel de carta muito fino para cada missiva não pesar mais, às vezes aproveitando o verso e o reverso da ténue folhinha.
Antigamente os que não escreviam, aproveitavam um canto final do que estava livre para acrescentarem os beijinhos, os abraços, os xis, as recomendações de todos os que se associavam de modo breve ao acto de se ter escrito.
Antigamente algumas cartas traziam fotografias, sujeitas à curiosidade, outras notas de banco escondidas, com risco de extravio.
Antigamente havia cartas perfumadas, cartas tarjadas de negro, cartas comerciais com facturas e outros efeitos na praça.
Hoje temos a internet e com ela o estarmos instantaneamente a toda a hora e por toda a forma em todo o lado.
Quando a rede falha e estamos longe, sentimo-nos abandonados à nossa sorte. Nem um aerograma, ao menos, em correio aéreo, nós por cá todos bem, saudades à mamã, à Xica e aos meninos...
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3 comentários:

Unknown disse...

Lindíssimo texto.

Beijos.

angela disse...

O bom mesmo é manter vários tipos de meios de comunicação, ao vivo, por carta, por correio, telefone e net, mas a ansiedade em algumas situações permanece...quantas vezes acessamos a caixa postal a espera de um e-mail¹
beijos

Dalva M. Ferreira disse...

Cada tempo tem o seu encanto. No tempo das cartas, no tempo da minha mocidade... parece que foi ontem, mas já é "no século passado"! Resta saber: o que o futuro nos reserva de tão maravilhoso quanto a emoção de receber uma carta muito esperada?