21 de abr. de 2011

O RIO

Max Ferguson - "Mr. Gordon", 2000 / Clique AQUI e conheça o site do pintor









O RIO.Ó rios de minha vida:
os que cruzei sem ter visto
e os que fluem, com mais tinta,
no pélago das retinas
de quem agora os recria!.




Não vi o Eufrates e o Tigre,
ou o esfíngico Nilo,
esse que corre por Biblos
e se derrama em estrias
às bordas de Alexandria.





.. E não vi, no Middle East,
o irascível Mississipi,
de que T. S. Eliot disse
ser um deus castanho e altivo,
cuja cadência se ouvia.




nos verdes quintais de abril,
no aroma das uvas híbridas,
no berçário dos meninos
e no óleo das lamparinas
que o duro inverno aqueciam..




De mãos dadas a esse ritmo,
vi o Tâmisa poluído
na Londres dos anos vinte;
vi-lhe as garrafas vazias
e as migalhas de comida,.




um rato a esconder-se, esquivo,
em meio às ervas daninhas.
E ouvi também, mais longínquo,
o riso que, ressequido,
do turvo rio se erguia.[...]




E o que dizer desse rio
que em dois hemisférios cinde
a rendilhada Paris?
O que dizer desse cisne
que Baudelaire viu um dia,.




tão ridículo e sublime,
a sujar as plumas límpidas
nas lajes do Sena esguio,
onde, entre náuseos detritos,
ia, aos tombos, se ferindo?.




Sobre o Arno, o grave e humilde
Ponte Vecchio se equilibra.
Ali, Dante viu Beatriz,
mas nele o amor que cintila
é o de Francesca da Rimini.[...]





Ó Tejo, ó tágides minhas!
Ó Camões sôbolos rios
que por Babilônia singram
e sangram todo o lirismo
de que vive e morre a língua!





.. Ó rio que viu Ulisses
fundar a velha Olisipo,
que depois Lisboa vira,
muito embora não o digam
a Odisséia e a llíada![...]





Falo, enfim, daquele rio
de cujas águas alígeras
ninguém sai igual a si
ou àquilo que está vindo
a ser, mas não é ainda..




Tudo se move. Esta é a sina
de todos, este o castigo
que nos coube, como a Sísifo:
o de sermos o princípio
e o fim, na mesma medida..




Por isso louvei os rios
que não começam nem findam
e que estão sempre fugindo
dessa fraude que os quer hirtos
como alguém que já não vive.



Ivan Junqueira
.
.

3 comentários:

Unknown disse...

Desejo-lhe uma Páscoa feliz.

Abraço.

Wilson Torres Nanini disse...

Ivan faz seu percurso pós-Rimbaud. Um Barco Embriagado da nova era.

Abraços!

GRAÇA FREIRE disse...

Que bom é receber a deliacadeza do seu blog.
Abraço,
Graça Freire

www.poesiaeprosapopeia.blogspot.com