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INTERIOR
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Havia uma rosa
no vaso. Veio do ocaso
a hora silenciosa.
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Guilherme de Almeida
in Encantamento, Acaso, Você. Editora UNICAMP, 2002, p.215
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Que fizeste das palavras?
Que contas darás tu dessas vogais
de um azul tão apaziguado?
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E das consoantes, que lhes dirás,
ardendo entre o fulgor
das laranjas e o sol dos cavalos?
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Que lhes dirás, quando
te perguntarem pelas minúsculas
sementes que te confiaram?
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Eugénio de Andrade
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Terceiro dia...
DESEJOS VÃOS
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Eu queria ser o Mar de altivo porte
Que ri e canta a vastidão imensa!
Eu queria ser a pedra que não pensa,
A pedra do caminho rude e forte!
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Eu queria ser o Sol, a luz imensa,
O bom do que é humilde e não tem sorte!
Eu queria ser a árvore tosca e densa
Que ri do mundo vão e até da morte!
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Mas o Mar também chora de tristeza…
As árvores também, como quem reza,
Abrem, aos Céus, os braços, como um crente!
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E o Sol altivo e forte, ao fim de um dia,
Tem lágrimas de sangue na agonia!
E as pedras… essas… pisa-as toda a gente! …
.Florbela Espanca
Segundo dia...
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Mentiras
Aí quem me dera uma feliz mentira
Que fosse uma verdade para mim!
J. Dantas
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Tu julgas que eu não sei que tu mentes
Quando o teu doce olhar pousa no meu?
Pois julgas que eu não sei o que tu sentes?
Qual a imagem que alberga o peito meu?
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Ai, se o sei, meu amor! Em bem distingo
O bom sonho da feroz realidade...
Não palpita d´amor, um coração
Que anda vogando em ondas de saudade!
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Embora mintas bem, não te acredito;
Perpassa nos teus olhos desleais
O gelo de teu peito de granito...
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Mas finjo-me enganada, meu encanto,
Que um engano feliz vale bem mais
Que um desengano que nos custa tanto!
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Florbela Espanca
Primeiro dia...
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AMAR
Eu quero amar, amar perdidamente!
Amar só por amar: Aqui...além...
Mais Este e Aquele, o Outro e toda a gente
Amar! Amar! E não amar ninguém!
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.Recordar? Esquecer? Indiferente!...
Prender ou desprender? É mal? É bem?
Quem disser que se pode amar alguém
Durante a vida inteira é porque mente!.
Há uma Primavera em cada vida:
É preciso cantá-la assim florida,
Pois se Deus nos deu voz, foi pra cantar!
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E se um dia hei-de ser pó, cinza e nada
Que seja a minha noite uma alvorada,
Que me saiba perder... pra me encontrar...
Florbela Espanca
Há cem anos nascia Adoniran Barbosa, o poeta do povo, o sambista dos excluídos.
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Continue vivo Adoniran, pegue o trem das onze e volte para casa!
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